(...)O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando fome. Não
liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos acompanhados
por maus elementos. O mundo quer defender o seu, não o nosso.
O mundo quer que a gente fique horas no telefone, torrando dinheiro.
Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos deixar
endividados por vinte anos. O mundo quer que a gente ande na moda, que a
gente troque de carro, que a gente tenha boa aparência e estoure o
cartão de crédito.
O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar através. Não
detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento. O
mundo quer que sejamos lindos, sarados e vitoriosos para enfeitar ele
próprio, como se fôssemos objetos de decoração do planeta. O mundo não
tira nossa febre, não penteia nosso cabelo, não oferece um pedaço de
bolo feito em casa.
(...)
O mundo quer nosso voto, mas não quer atender nossas necessidades. O
mundo, quando não concorda com a gente, nos pune, nos rotula, nos
exclui. O mundo não tem doçura, não tem paciência, não pára para nos
ouvir. O mundo pergunta quantos eletrodomésticos temos em casa e qual é o
nosso grau de instrução, mas não sabe nada dos nossos medos de
infância, das nossas notas no colégio, de como foi duro arranjar o
primeiro emprego. Para o mundo, quem menos corre, voa. Quem não se
comunica se trumbica. Quem com ferro fere, com fero será ferido. O mundo
não quer saber de indivíduos, e sim de slogans e estatísticas.
(...)
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